A Covid-19 é ou não uma doença do trabalho?

O valor dos danos morais trabalhista
18 de agosto de 2020

Prezados leitores, muito se discute no âmbito jurídico se a Covid-19 é ou não uma doença do trabalho. Para entendermos sobre o assunto, doença do trabalho é classificada como uma enfermidade adquirida pelo empregado no ambiente de trabalho.

Diante disso, resta a pergunta: um funcionário que é diagnosticado com Covid-19, deve ser enquadrado como uma doença do trabalho ou não?

Pois bem, para tentar resolver a celeuma, na Medida Provisória 927, de 20 de Março de 2020, que não foi votada no Congresso Nacional dentro do prazo legal e já se expirou, constava em seu artigo 29 que: “Os casos de contaminação pelo coronavírus (Covid-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal.”

Acontece que referido dispositivo legal não resolveu o problema, pois apenas manteve uma regra que já existe na lei previdenciária, onde dispõe que as doenças endêmicas não são consideradas ocupacionais, salvo se comprovado o nexo de causalidade (art. 20, §1º, alínea “d”,  da Lei 8.213/91). Endemia significa uma enfermidade que atinge uma região e tem causas exclusivamente locais.

Assim, se em relação às doenças endêmicas já existe essa previsão legal, não poderia ser diferente com relação a uma doença pandêmica, como é o caso da Covid-19.

Mas essa previsão legal é uma presunção, ou seja, se ficar comprovado que o funcionário foi contaminado pela Coivd-19 no ambiente de trabalho, será considerada uma doença do trabalho, pois ocorreu o nexo de causalidade entre a doença e o trabalho desenvolvido pelo trabalhador.

Contudo, para gerar mais dúvidas sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal (STF) acabou suspendendo o artigo 29 da MP 927. Com essa suspensão, ao invés da suprema corte do judiciário brasileiro aclarar o assunto, acabou criando mais dúvidas no mundo jurídico.

Para gerar mais dúvidas ainda sobre o assunto, o Ministério da Saúde publicou no dia 1º de Setembro de 2020, a Portaria nº 2.309, e atualizou a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT), classificando a Covid-19 como uma doença ocupacional.

É oportuno esclarecer que a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT) tem por objetivo orientar os profissionais da saúde sobre a caracterização das relações entre as doenças e as ocupações profissionais dos trabalhadores.

Assim, no dia 1º de Setembro a Covid-19 passou a ser considerada uma doença relacionada ao trabalho. Acontece que, no dia seguinte (02/09), por meio da Portaria nº 2.345, o Ministério da Saúde tornou sem efeito a Portaria 2.309, ou seja, a Covid-19 deixou de ser considerada uma doença ocupacional.

O assunto é de extrema importância, pois os efeitos jurídicos da Covid-19 ser ou não considerada uma doença do trabalho são relevantes, e por isso não pode haver dúvidas. Por exemplo, se a Covid-19 for considerada uma doença do ocupacional, e tendo ocorrido o afastamento do funcionário por mais de 15 dias (o que fatalmente acontece com a Covid-19), o empregado receberá auxílio previdenciário e terá estabilidade no emprego de 12 meses após o retorno ao trabalho (art. 118, da Lei 8.213/91).

Além disso, caracterizando a Covid-19 como uma doença do trabalho, o empregado também poderá responsabilizar a empresa e poderá pleitear uma indenização por eventuais danos materiais e morais em decorrência da doença.

Apesar da problemática em considerar ou não a Covid-19 como uma doença do trabalho, é importante que as empresas sejam diligentes e adotem as medidas necessárias para combater a disseminação do coronavírus em seu ambiente laboral, fornecendo aos seus empregados equipamentos de proteção individual (EPI) adequados (como por exemplo máscaras), distanciamento entre seus funcionários, fiscalização para evitar aglomeração de pessoas, fornecimento de álcool em gel, higienização do ambiente de trabalho entre outras medidas.

Ou seja, se o empregador comprovar que adotou as medidas preventivas adequadas, terá como demonstrar que a contaminação do trabalhador pelo coronavírus não ocorreu no ambiente de trabalho, de modo que há grande chance de não caracterizar a Covid-19, nesses casos, como uma doença ocupacional.

Portanto, é importante que as empresas criem mecanismos de prevenção e proteção dos seus trabalhadores, e que documentem todas as medidas adotadas com o objetivo de afastar a Covid-19 como uma doença decorrente do trabalho, e assim evitar uma eventual responsabilização.



MURILO KERCHE
• Advogado e Professor
• Mestre em Direito
• Especialista em Direito do Trabalho Empresarial

10 Comments

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